quarta-feira


Pai, trago treze anos já crescidos de alma num corpo franzino e intimidado.
Partilhas comigo os teus receios e angústias como se fôssemos do mesmo tamanho. Falas-me deles, e eu, que os conheço por dentro, ouço-os de ombros encolhidos e agacho as minhas lágrimas para ser maior aos teus olhos.Também sinto medos e não tenho coragem de tos contar. Algumas vezes senti vontade de abrir as mãos e mostrar-te o que guardam, as marcas na pele que se colaram como tinta de carimbo. Mas como explicar-te que não conseguiste proteger-me mesmo querendo-me tão bem?
Fico quieta e dou-te apenas um abraço.
Agora já pouco importa. Pedi-te que não fosses, mas o teu tempo não esperou. E, com a cabeça entre as mãos e os olhos cerrados tentei fugir da sensação de atropelo que sentia nos ossos naquele dia frio de Novembro. Doíam-me todas as ideias e todas elas corriam em direcção a um estômago retraído de desespero. 
Este desencontro entre o teu tempo de vida e a minha adolescência deixou-me uma revolta que teimou em ficar. Hoje, tantos Novembros depois, a alma continua vincada, às vezes doída e mais velha que eu. Nunca a consegui despir.

1 comentário:

InkBottle disse...
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